quarta-feira, abril 19, 2006

Cidades e poesia

Algo curioso que me tem sucedido nas últimas viagens é que identifico os lugares que visito com um poeta e que o poeta acaba por fundir-se com o lugar de tal jeito que não me é possível separá-los, ao poeta e ao lugar. Na última vez que estive em Irlanda, foi Patrick Kavanagh; na anterior visita a Lisboa, Pessoa -nesta última Eugénio de Andrade-.

A recente viagem a Roma supôs a re-descoberta de John Keats, que morreu numa casa ao pé das escaleiras da Piazza de Espagna em 1821. Tinha 25 anos e chegara a Roma num intento fútil de se librar da tuberculose que matara sua mãe e seu irmão. Essa casa é agora um modesto e emotivo museu dedicado à sua memória assim como à de Shelley, que também morreu em Itália e que chorou a morte de Keats no seu poema Adonais.

Ambos poetas estão enterrados no mesmo cemitério romano, conhecido como "cemetério protestante" pelos anglo-saxões ou como "cimetero accatolico" pelos italianos. O local é tão formoso (ao pé da pirámide de Caio Cestio) que Shelley disse dele: "it might make one in love with death, to be buried in so sweet a place".

Além deles, também estão lá os restos mortais do filho de Goethe, do comunista Gramsci, dum von Humboldt, do pintor Severn (em cujos braços morreu Keats), do aventureiro Trelawny (amigo de Byron e Shelley) e do poeta americano beat Gregory Corso. A encargada do museu Keats-Shelley disse-nos que o cemitério está a sofrer dificultades económicas e que pedem às visitas uma contribuição voluntária de pelo menos 2€.

Se ides a Roma, e amais a poesia, são duas visitas obrigadas. Não esqueçais a contribuição, por favor!

Ps: no cemitério, não deixeis de ler os epitáfios! O de Keats é especialmente formoso: "Aqui jaz um cujo nome foi escrito na água". O seu nome não aparece na lápida, ainda que a localização da sua tumba está bem indicada. O resto da inscripção não foi a que o poeta pediu, e foi engadida por um amigo.

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